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PLENÁRIA ESTADUAL DE FINANÇAS SOLIDÁRIAS NA BAHIA: SECRETÁRIO ESTADUAL DO TRABALHO PROPÕE GRUPO DE TRABALHO
Dia 27 de abril aconteceu, em formato virtual, uma Plenária Estadual de Finanças Solidárias na Bahia, promovida pelo Fórum Baiano de Economia Solidária e os integrantes da sociedade civil do Grupo de Trabalho de Finanças Solidárias vinculado ao Conselho Estadual de Economia Solidária.
Um total de 83 participantes de associações gestoras de Fundos Rotativos
Solidários, Bancos Comunitários de Desenvolvimento, Cooperativas de Crédito
Solidário, CESOL -- Centros Públicos de Apoio à Economia Solidária, entidades
de apoio e movimento social debateram os resultados e impacto de mais de 20
anos de experiência nas finanças solidárias no Estado e apresentaram suas
propostas para a política pública estadual no contexto do Programa Bahia
Solidária. Do poder público, participaram Davidson Magalhães, Secretário Estadual do Trabalho, Emprego,
Renda e Esporte, Milton Barbosa, Superintendente Estadual de Economia
Solidária, José Paulo Ferreira, Coordenador de Microcrédito e Finanças
Solidárias e outros técnicos da SETRE.
Finanças Solidárias na
Bahia: mais de vinte anos de emancipação financeira de setores excluídos do
microcrédito de mercado
Num primeiro momento, a Plenária
assistiu três depoimentos de experiências de Finanças Solidárias beneficiadas
com recursos do Edital 03/2018 da SETRE/BA que injetou R$3 milhões em 11 projetos.
Thiago Muniz, agente que apoia os Bancos Comunitários Santa Luzia, da península
de Itapagipe, em Salvador e Ilhamar, em Veracruz, Ilha de Itaparica, relatou o
forte impacto que o projeto financiado teve nos dois territórios. O valor de R43.000
financiou o fomento de 11 empreendimentos de economia solidária envolvendo 23
pessoas diretamente. Adicionalmente, a credibilidade conquistada por conta do apoio
da SETRE contribuiu para que o Banco Santa Luzia conseguisse firmar outras
parcerias, que injetaram outros recursos. A circulação da moeda social Umoja
aumentou em 40%, houve adesão à moeda social digital E-dinheiro da Rede
Brasileira de Bancos Comunitários, e os jovens do Bairro iniciaram o Fundo
Rotativo Solidário Umoja Juventude. “É muito evidente que o Banco Comunitário e
circulação da moeda social ajuda dinamizar a economia do Bairro, porque injetam
recursos tanto na produção como no consumo local,” afirmou Thiago. Em terceiro
lugar, a Associação de Moradores do Uruguai, gestora do Banco Santa Luzia, se
engajou em ações emergenciais, mobilizando e distribuindo cestas básicas e
outros apoios que transferiram R$25.000 em renda para as famílias mais
vulneráveis do bairro.
Marcely Macedo da ASCOOB relatou
os resultados e o impacto do investimento de R$1,49 milhão do Edital 03/2018 na
Rede ASCOOB de cooperativas de crédito solidário. O recurso viabilizou a
contratação de agentes de crédito e abertura de postos de atendimento em 24
municípios não atendidos anteriormente. O valor investido pela SETRE alavancou
mais de R$7 milhões em microcrédito para 2.300 cooperados. “Conseguimos
oferecer condições diferenciadas de crédito para alcançar um público
anteriormente não atendido,” acrescentou Gelvane Santiago, Diretor Operacional
da ASCOOB. “O valor médio do crédito foi
de R$2863, bem abaixo da média geral das cooperativas, porque a ideia foi de oferecer
empréstimos para cooperados com pouca ou nenhuma experiência anterior com
crédito,” informou. As quatro cooperativas participantes do Projeto conseguiram
absorver 13 dos agentes no seu quadro permanente de agentes.
Rogério Guilhermino, do município
Senhor do Bonfim relatou a experiência da ARESOL – Associação Regional dos
Grupos Solidários de Geração de Renda. Lembrou que a ARESOL é fruto um de uma
experiência antiga de Fundos Rotativos promovida a partir dos anos 1990 na
Diocese Senhor do Bonfim. Na época, a Pastoral da Criança distribuía cabras
leiteiras para as famílias nas comunidades rurais para oferecer uma fonte de
leite às crianças desnutridas, porque a mortalidade infantil e insegurança
alimentar eram altíssimas em municípios como Monte Santo, Itiuba, Queimadas e
outras na Diocese. As famílias beneficiadas repassaram uma cria da cabra para
outra família, multiplicando o benefício e dando início à prática do Fundo
Rotativo de animais. A partir de 2003 a Pastoral da Criança viabilizou a
contratação de uma equipe técnica remunerada para ampliar o fomento de grupos
produtivos solidários e do Fundo Rotativo Solidário. Em 2007, os primeiros 32
grupos produtivo financiados criaram a ARESOL para assumir a auto gestão do
Fundo Rotativo. Nos anos seguintes, a Associação evoluiu: iniciou a Rede de
comercialização Monte Sabores, se qualificou para prestar ATER, assumiu a
gestão de um CESOL e criou a CooperSabor, cooperativa da agricultura familiar
que hoje fatura mais de R$1 milhão por ano. Os recursos do Edital 03/2018 viabilizaram
financiamentos para requalificar 11 empreendimentos envolvendo 78 famílias e
melhorar os pontos de comercialização da Rede Monte Sabores.
Em conjunto, os projetos
financiados com os recursos do Edital 03/2018 beneficiaram diretamente pelo
menos 3000 pessoas e alavancaram pelo menos 4 vezes o valor investido em crédito
(R$7,5 milhões) ou contratos de comercialização para o PAA e PNAE (>R$5
milhões).
As finanças solidárias – Fundos
Rotativos Solidários (FRS), Bancos Comunitários de Desenvolvimento (BCDs) e Cooperativas
de Crédito solidário – têm uma longa história na Bahia. Os primeiros FRS
surgiram na Bahia nos anos 1980 com apoio do MOC, da Cáritas, Pastoral da
Criança e outros. Atualmente existem pelo menos 40 FRS na Bahia que envolvem
por volta de 50.0000 pessoas em mais de 80 municípios. Dez BCDs surgiram entre
2004 e 2018 com apoio estratégico da ITES/UFBA. As cooperativas de crédito
solidário surgiram na Bahia a partir dos anos 1990. A Rede ASCOOB conta com 16
cooperativas com 50.000 cooperados em 30 municípios.
Diferente do microcrédito, as
finanças solidárias partem de uma visão de vocação e desenvolvimento
territorial e do conjunto de necessidades do público atendido. O financiamento
é sempre acompanhado por educação financeira, formação em gestão, assessoria,
acompanhamento técnico e organização associativa, e os termos do financiamento
são desenhados a partir da necessidade e capacidade do sujeito atendido. O
patrimônio do FRS e BCD é de propriedade coletiva, a gestão é da
responsabilidade dos associados ou seus representantes eleitos. A cooperativa
também é dos cooperados mas precisa aderir ao regulamento do Banco Central. As
organizações mais bem sucedidas de finanças solidárias conseguem atrair outros
investimentos para o território, a exemplo das experiências citadas.
Propostas da sociedade
civil: microcrédito é importante, mas não suficiente
Barbara Schmidt Rahmer,
integrante do GT de Finanças Solidárias e Presidente da Rede Vencer Juntos de
Fundos Solidários, reagiu à proposta do Governo do Estado de ampliar a oferta
de microcrédito e apresentou as propostas elaboradas pelo GT. Citando dados do
Banco Central sobre o Programa Nacional de Microcrédito Orientado e do Banco do
Nordeste sobre o Programa CrediAmigo, chamou atenção que o acesso ao
microcrédito das pessoas com renda até um salário mínimo diminuiu na crise
econômica de 2017-2019. “A maior parte do público da economia solidária não
consegue acessar o microcrédito nos melhores tempos. Na crise atual, as pessoas
mais vulneráveis já tiveram que renegociar dívidas antigas que vencerão nos próximos
meses. Difícil imaginar que essas pessoas têm condições de contratar novos
créditos agora,” Barbara alertou.
Diante disso, as organizações e o
público das finanças solidárias cobram, além da ampliação da oferta de
microcrédito, uma ampliação dos investimentos públicos não reembolsáveis nas
práticas de finanças solidárias. “Boa parte do investimento público nas
finanças solidárias, mesmo que não volte para os cofres do Estado, vai se
multiplicando nos territórios, porque os empreendimentos de economia solidária
devolvem o recurso para os fundos rotativos e bancos comunitários locais,”
lembrou Barbara.
O GT de Finanças Solidárias
propõe que parte de um investimento adicional nas finanças solidárias seja
destinada à criação, por parte das experiências apoiadas, de fundos de aval. Os
recursos do fundo de aval seriam utilizados para construir financiamentos
híbridos que combinam recursos de microcrédito e recursos do fundo rotativo
solidário para facilitar o primeiro acesso ao microcrédito ou cartão de crédito
daquelas empreendedoras e empreendedores da economia solidária mais
experientes. “Por exemplo, nossas artesãs poderiam ganhar acesso ao seu
primeiro cartão de crédito que permitiria comprar a matéria-prima em maior
quantidade, parcelando o pagamento no cartão sem juro. Quando a artesã, por
conta de algum problema, não consegue fazer o pagamento integral da fatura do
cartão, o fundo rotativo cobre e á ressarcido depois,” explica Barbara.
Com o Programa Bahia Solidária o
Governo Estadual reconhece que uma estratégia de apoio à Economia Solidária
precisa oferecer um tripé de serviços integrados ao público atendido: (1)
Serviços técnicos: formação, assessoria e acompanhamento; (2) Apoio à
comercialização e organização associativa e (3) Finanças Solidárias e acesso ao
crédito. “Nos primeiros dois eixos o Estado implantou estratégias robustas que
vêm recebendo investimentos significativos, mas no eixo das finanças solidárias
não enxergamos ainda uma estratégia. O apoio neste campo tem sido pontual,”
observou Barbara.
Uma estratégia mais consistente
nessa área abordaria as seguintes questões, entre outras: (1) papel dos CESOLs
no fortalecimento das finanças solidárias; (2) consolidação das experiências de
finanças solidárias bem sucedidas em territórios sem CESOL; (3) relação entre
finanças solidárias e microcrédito – financiamentos híbridos; (4) adoção de
moeda social por alguns municípios -- incentivar pilotos na Bahia (ex. São João
do Arraial, PI), (5) construção de parcerias estratégicas com bancos públicos,
sociedade civil e outros.
Secretário: Concordo que
precisamos de uma estratégia de finanças solidárias
Davidson Magalhães, Secretário
Estadual, reconheceu que o país está vivendo um momento extremamente difícil e
que os setores populares são os que mais estão sofrendo com essa situação. “A
pauta do desenvolvimento foi esquecida nesse país. Precisamos retomar essa
pauta,” afirmou. Chamou atenção para a
importância da assistência técnica e financiamento para as cadeias produtivas
da agricultura familiar e dos pequenos produtores urbanos. Depois de escutar a
proposta do GT de Finanças Solidárias, o Secretário propôs a formação de um
grupo de trabalho para discutir a proposta. “Vocês podem designar dois ou três
participantes. ... Precisa ser rápido, não podemos perder a oportunidade do
Programa Bahia Solidária. .. Concordo que precisamos de uma estratégia de
finanças solidárias. O que encontrei já é uma iniciativa, mas ainda falta o que
Vocês levantaram.,” concluiu.
Milton Barbosa, Superintendente
de Economia Solidária, levantou a importância de juntar e analisar dados mais
específicos sobre o perfil do público que acessa as finanças solidárias. “Tenho
a impressão que parte desse público poderia acessar, sim, o microcrédito, principalmente
com as condições mais favoráveis de um CrediBahia reformulado,” afirmou Milton.
O DesenBahia disponibilizará R$100 milhões para o programa de crédito
CrediBahia que prevê prazos de até seis meses de carência, até 24 meses para a
devolução e taxas de juro mais baixas que outras linhas de microcrédito no
mercado. O Programa será aberto para admitir outros operadores além das
prefeituras. O Superintendente também lembrou que os CESOL têm recursos para
operar Fundos Rotativos Solidários para fomentar novos empreendimentos.
“Estamos investindo R$1,6 milhão para viabilizar esses fundos rotativos,”
informou.
Alertou que os recursos públicos
para as políticas públicas de economia solidária são importantes, mas que o
volume de recursos disponíveis para o microcrédito orientado sempre será muito
mais significativo. “Por isso acho que a melhor estratégia é uma aproximação
entre as finanças solidárias e os programas de crédito,” declarou. “Comemoro
que Vocês estejam também com esta proposta ensaiando um esforço nesta direção.”